Saturday, June 5, 2010

A Primeira Vez



Tem sempre a primeira vez para as experiências ou as percepções que a gente tem no decorrer do nosso tempo aqui. E a primeira vez é sempre a que deixa um cheiro, um gosto, uma idéia que vai nos acompanhar pro resto da vida. Essa é uma tentativa de apresentar as minhas primeiras vezes – um pouco censuradas e editadas – e as primeiras vezes de quem quiser deixar tal testemunho aqui. Claro que algumas das primeiras vezes aconteceram há tantos anos que tomei a liberdade poética de criar uma versão aproximada ao fato, ao que a memória permite.
Começo com a primeira vez que voei. Era um domingo comum, sem nada para fazer e, bastante raro na minha família, a casa estava deserta – só nós, os 3 caçulas com os pais... os 3 mais velhos estavam numa festa para o fim de semana num sítio de amigos e os 3 do meio estavam participando de alguma atividade esportiva no clube. Meu pai, que geralmente estaria no clube jogando o seu pseudo vôlei, estava em casa e resolveu nos levar para um passeio especial e bem paulistano. Nos enfiamos no carro (que não lembro bem qual era o carro da época do ocorrido e que, de fato, não faz a menor diferença) e seguimos para nada mais nada menos do que Interlagos – na Represa de Guarapiranga (que para os paulistanos menos sofisticados, trata-se do Balneário).
Acho que era início de verão, pois o sol estava de rachar – passeamos pela “orla” – nada para se fazer – o balneário estava cheio de seus típicos visitantes: a turma da Kombi e do picnic – famílias se torrando no sol, comendo o franguinho com farofa trazido no isopor, a cerveja quente, uma porção de meninos chamados Kleber (ou Creber), mulheres empapadas com seus cães pequinês na coleira, lixo e chinelos perdidos. Meu pai foi o primeiro a perceber que o passeio fora um engano – o que fazer na represa sem maiô, chinelo (perdido ou não), frango ou que quer que seja num dia de calor como aquele? Acho que a última vez que meus pais tinham ido à represa foi antes de se casarem – e se essa história se passa em meados de 70, então fazia pelos menos quase 20 anos que eles não punham os pés nas águas da Guarapiranga.
Estávamos já prontos para irmos embora quando meu pai avistou o aviãozinho que sobreava a represa e pousava na água! Ah, que oportunidade! Corre entrar na fila e garantir um vôo. Minha mãe não se interessou e resolveu esperar na tenda que vendia sucos e pastéis – então seguimos eu, meu pai, Celina e Sylvio para nossa aventura aérea! Nem acreditava que eu finalmente ia voar num avião – coisa sofisticada!

A fila até que não demorou muito – ou pelomenos foi a impressão da minha mente de criança que se distraía ao ver o aviãzinho decolar e pousar na água – nós 3 fascinados com a maquininha. Quando nos demos conta, já era a nossa vez e... mas espera aí: e mais essa outra família atrás de nós? E onde vai caber todo mundo num aviãzinho tão pequenininho que mais parece um KarmanGhia???? O piloto foi logo coordenando o embarque: eu, Sylvio e meu pai na frente com ele; Celina e a família invasora, atrás. Eu e Sylvio dividimos o mesmo cinto de segurança – e tivemos que sentar no meio, ou seja, a viagem panorâmica era só para o piloto e quem estivesse nas janelinhas... tudo bem, pelo menos eu ia voar. Respira fundo, Paula, o avião está prestes a decol.... o que? Já acabou? Já voamos???? Por muitos anos, eu achei que voar era como andar de carro sem pegar a janela – até que eu tive o meu segundo vôo, que foi a minha primeira viagem de avião, quando eu já tinha 16 anos! Mas esse é assunto para outra história.